quarta-feira, 10 de julho de 2013

Flip (diário - post 3)

Primeira mesa que assisti

No centro Eduardo Souto de Moura e `a direita Paul Goldberger
Eu tinha saído de São Paulo menos de 24 horas antes, passado por uma viagem de ônibus e um trajeto a pé. De repente me senti ter caído de uma nuvem diretamente para uma poltrona da tenda dos autores diante do tema "As medidas da história" com o arquiteto português Eduardo Souto de Moura e o crítico de arquitetura e urbanismo da revista The New Yorker Paul Goldberger. 

Não eram bem as personalidades que eu esperava ver, nem o assunto que mais intensamente poderia entrar em meu coração, por isso era a textura de estar ali, o frio vigoroso, por conta do ar condicionado, que contrastava com o sol que fazia do lado de fora, e todas aquelas pessoas reunidas em silêncio interessadas em ouvir. Ouvir, ler, dar atenção, essas capacidades atrofiadas do ser humano e que percebo atrofiadas em mim mesma...

Eu falo, escrevo, recebo milhares de informações, mas poucas permito, de fato, a entrada. Fica quase tudo na superfície. Foi assim durante toda essa mesa. Ouvia as pessoas rirem, interagirem, escutava alguma frases. Até que um deles tocou na palavra "psicanálise". Enfim uma palavra pela qual tenho vínculo afetivo, pensei. Disse que a arquitetura é uma espécie de psicanálise, porque o arquiteto deve interpretar o desejo do cliente tal qual um psicanalista interpreta um sonho. E esse desejo será exposto em traços, sob uma folha em branco - neste ponto fiz uma analogia interna e silenciosa com o trabalho do escritor que tem todas as possibilidades diante de uma folha em branco - com o arquiteto imerso em toda sua capacidade de síntese para que possa expressar em um pequeno espaço algo que será de escala muito maior: uma casa, um prédio... Uma caverna em que irá habitar o homem, o primeiro a sonhar. Precisa acontecer não só uma empatia, mas uma certa telepatia entre cliente e arquiteto. 

Algumas anotações ficaram em meu bloquinho:

Arquitetura é a vontade de uma época traduzida em espaço.

O futuro não me interessa porque chega demasiado depressa. 

As duas ditas por Eduardo, a segunda citando Einstein.

A segunda mesa que assisti foi pela tenda do telão. Uma conversa com Gilberto Gil e Marina de Mello e Souza sobre culturas locais e globais.

Desta, a beleza que ficou comigo foi a ensinada por Marina no que se refere `a cultura de Paraty e, que de certa forma, combina com a  parte mais encantadora da cultura brasileira, na minha opinião. Segundo Marina, a cultura de Paraty é permeada por festas. Sempre que chegava `a cidade, desde sua juventude, nos anos 80 ouvia "Que pena que você chegou só hoje, perdeu a festa de ontem". E quando ia embora diziam "Fica mais... Vai ter uma festa!" E olha que isso é tão verdade que eu mesma perdi uma festa que aconteceria no dia em que fui embora... E a festa está tão intrínseca na Flip e em Paraty que o próprio nome do evento é FESTA Literária Internacional de Paraty. Está longe de ser uma feira, como a Bienal do Livro, é um encontro para celebração da literatura, da escrita, da leitura, da poesia... Muito bonito de ver e mais ainda de sentir. Aliás as imagens que ficaram comigo dessa viagem são um puro poema íntimo que sorri dentro de mim.

(continua)

Nenhum comentário: