segunda-feira, 24 de setembro de 2018
24a CARTA PARA MINHA FILHA - sobre não saber
sábado, 22 de setembro de 2018
23a Carta para minha filha
23a Carta para minha filha
Você redimensiona o mundo, meu olhar, meu sentir, eu mesma.
A cada olhar para você uma ampliação.
Tens o cheirinho perfumado de uma flor que é humana, plantada por um profundo amor, de dois corpos e duas almas.
Você eterniza uma união efêmera…
Em você seu pai e eu estaremos unidos para sempre.
O amor que você faz acordar em mim é um território que eu desconhecia e ainda desconheço, é você que me guia ao se revelar e assim revelar uma planície intocada de mim mesma. Cada dia uma descoberta. Descubro você crescer, ganhar bochechas maiores e mais rosadas, um papinho abaixo do queixo, os olhos cada vez mais alertas reconhecendo o mundo. Há uns 3 dias você olha as paredes, os quadros da casa, os violões e máscaras que temos pendurados na sala. Você agora vira o rosto e parece tentar emitir com a boca o som das nossas vozes quando conversamos com você.
Temos tanto tempo juntas, mas esse tempo corre tão depressa. Não é mais o mesmo tempo de antes. Tudo acelerou e também ficou mais lento. Demoro mais para fazer o que eu fazia, o relógio não me espera. Os dias correm sem caber neles as minhas vontades, os meus planos, ou mesmo meu sono. Você dorme por horas durante o dia. À noite às vezes demoro horas para conseguir que você pegue no sono.
Amanhã seu pai volta a trabalhar e viveremos uma nova fase, assim como serão sempre novos nossos dias. Os adultos são tão previsíveis e iguais. Você muda o tempo todo antes que eu me acostume.
Estou sendo uma boa mãe? Você se sente amada? É o que me pergunto e te pergunto quando estamos a sós. Quero tanto que você sinta meu amor...
Amo o seu biquinho que antecede o choro, quando as extremidades das laterais da sua boca descem e seus lábios formam o desenho de uma meia lua deitada para baixo. Tenho pouco tempo quando olho para esta cena, pois meu corpo tem o impulso selvagem de enlaçar você nos braços e do bico dos meus seios jorra um leite puro para alimentar tudo que te falte. Para que nunca falte. Para que eu nunca falte pra você. (Ainda que eu mesma me falte). Sua mãe.
(escrito em 17/9/2018)
quinta-feira, 13 de setembro de 2018
22a Carta para minha filha
“Ela vai crescer rápido”
Ele me disse essa madrugada, com você no colo, no intervalo de uma canção de ninar que balbuciava.
Tive alguns segundos para pensar se estava se referindo a algum conhecimento biológico sobre seu crescimento, mas ele completou:
“Passa tão rápido. Por isso quero aproveitar todos os momentos”.
Desde que você chegou, escrevo este texto no seu 19o dia, seu pai trocou praticamente todas as suas fraldas. A sua vovó também várias e eu poucas. Mesmo assim vivemos momentos muito intensos, só eu e você, enquanto todos dormiam, ou enquanto só havia nós mesmo, ainda que todos estivessem acordados em volta. Você ainda não sabe que sou sua mãe. Você procura meu seio no ar mesmo quando estou muito perto. É como se você nem sequer me visse ou percebesse a minha existência. Sei que bebês são assim mesmo nesta fase, mas eu me enxergo sendo muito sua, um pouco perdida de mim mesma, renunciando minhas vontades, meu conforto, para que não te falte leite, colo, ou companhia. Ainda que esteja tudo misturado pra você, todas as companhias, colos, leite (apesar de nesse caso ser sempre eu), te dão o mesmo conforto, quando você o consegue sentir, o mesmo sono, quando ele chega, não importa muito quem seja… Mas, às vezes, parece que faço alguma diferença quando observo você se acalmar de um choro nos meus braços. E sei que estas singelas situações tem me importado mais porque meus dias tem sido você. Como qualquer ser humano é de fora que acabo procurando o afeto essencial do meu ser. Então, mesmo você sendo tão frágil e pequenina, me pego esperando de você reconhecimento e amor, o que ainda parece muito cedo para que consiga me dar. Sendo assim sou sempre eu que te dou, de uma fonte que eu nem sabia que seria capaz de oferecer, uma nascente interna e abundante, do leite que jorra do meu seio, o seio do meu corpo e do meu sentimento. Assim como você expandia meu corpo, minha pele, agora expande meu coração, um vasto lugar, de onde tiro forças e intensidade para soprar a você potência, alma...
Nossos encontros, em noites mal dormidas, madrugadas adentro, quando só alguns pássaros estão acordados e cantam no silêncio desta enorme cidade, como se soubessem que, ali muito perto, há uma mãe a alimentar sua filha. Esta mãe está exausta e sua bebê chora sem que o motivo fique claro. Aos poucos se esgotam as tentativas de acalmá-la. É sempre o peito que cala o choro e faz dormir, mas isso pode durar uma sequência de horas, até que se instale na penumbra do quarto um intervalo silencioso cujas vozes se apaziguem com o cerrar dos olhos. Somos duas crianças e duas mulheres querendo descanso.
Nina, vou sentir saudade de tudo isso. Mesmo quando tão intensamente desejo que passe. Vou sentir saudade. E, como bem me lembra seu pai, passa rápido, meu amor, passa muito rápido!
(Escrito em 13/9/2018, Nina tem 3 semanas e 1 dia)
domingo, 2 de setembro de 2018
21a Carta para minha filha
21a Carta para minha filha
Quando o amor veio singelamente suspirar suas cantigas de vento em meus ouvidos/
Eu soube, não haveria espera que não te enviasse ao meu corpo/
Nem sonho que não te criasse em meu colo/
O amor vinha sussurrar seus nomes/
Pequeninos e imensos cristais de tocar com dedos delicadamente/
Jamais saberia escolher um para te representar.../
Verdes são as frutos nas árvores intocadas/
Você no ventre ainda imatura a amadurecer tua árvore de leite/
Beberás o leite como uma gotinha orvalhada da noite derradeira/
Sempre sedenta como uma flor no deserto/
Tua alma vem com histórias que vou contar, para que nosso canto nunca cesse/
Um canto feito de vozes, música, danças e doces/
Convertido em beijinhos na face rosada, ou lágrimas de sentir demais você/
Essa água não cabe mais em mim/
Choro meu amor, canto meu amor, nino meu amor no peito/
Uma menina, uma pétala, eu, seu pai: uma família/
Eu te nino, me-Nina, Nina o pai também/
Pois és preciosa e pequenina mas sua grandiosidade nos ensina/
O amor que não sentimos antes/
Guardado estava, pra você brincar.
#cartasparaminhafilha