domingo, 12 de agosto de 2018

20a Carta para minha filha - Dia dos pais



Sabe, filha? Eu ainda sonho com meu pai. Em como seria a minha vida se ele estivesse aqui. Nos sonhos é como se nada tivesse acontecido. Hoje acordo de um deles e me lembro da sensação boa dele existir e me ajudar no que fosse preciso, dele saber resolver problemas e me dar segurança naquilo em que eu não me sentia capaz. E reflito que essa relação que eu e você criamos pode atravessar nossa vida, além da morte do corpo, de um jeito tão profundo, que eu e seu pai poderemos viver enquanto você viver, através dos seus sonhos, das suas lembranças, do nosso amor, entrelaçado em mil palavras que te escrevo, em lágrimas de saudade que derramaremos, na força de um elo inquebrantável, que não se confirma no sangue, no gene, ou na carne, mas no olhar. O mesmo olhar que você irá sempre me lançar, como o de quem vê uma força misteriosa logo que nasce.  E também o meu olhar, capaz de amadurecer um pouco mais meus olhos, a cada vez que mirarem quem você é. Quem você é, filha? Como chamarei você? Por um nome que seu rosto irá me sussurrar? Ou de filha, como tenho te chamado?

Terei histórias para contar sobre seu avô, mas você só compreenderá através do que irá sentir no peito por seu pai. O brilho que seus olhos vão emitir ao vê-lo cantar, viver, ou te ninar. Será um reflexo um pouco tardio do brilho que sua presença há de fazer emergir dos olhos dele, como o sol faz emergir da água as flores aquáticas, e faz abrir os botões perfumados de todos os jardins. 

Da nossa experiência juntos se abrirão caminhos em seu futuro e por mais que tentemos não interferir você poderá lembrar de nós (como tenho feito com meu pai) além de 40 anos da data que você nasceu. Quando você irá nascer?

Eu já tenho 39, lembro das mãos robustas do meu pai, em uma cor mais jambo que a minha pele, dedos gordinhos e uma letra muito característica e caprichosa em tudo que escreveu meu pai. Lembro de uma alegria que ele buscava para me ver sorrir e me surpreender, mesmo que não a sentisse tanto e sempre. Mas havia seu entusiasmo, esse sim muito genuíno, e sua vontade de viver e testemunhar a vida de suas filhas por muitos mais anos do que a doença permitiu. E, mesmo doente, seu avô me deu a oportunidade de conhecer seu pai, filha, a quem ele reconheceu como a um espelho. É uma história que não me canso de repetir. Todo escritor tem a sua história original, clássica, como se dela nascessem todas as outras, a minha deve ser essa. Escrever é recontá-la, lembrá-la. O dia em que meu pai conheceu o seu. O dia em que vi juntos os 2 dois homens que mais amo. Meu pai reconheceu o seu, como se o estivesse procurando há muito tempo, como se percebesse que ele seria seu pai, filha, “o pai da filha da minha filha”, ele poderia ter pensado. 

Em uma noite desta semana eu acordei várias vezes, seu pai ficou ansioso achando que era um anúncio do seu nascimento. Então ele chegava perto de mim e com as mãos na minha barriga sentia as contrações de treinamento. Não conseguiu dormir mais naquela noite. Ligou várias vezes durante o dia. Ele quer tanto te conhecer. 

Achei que pudesse ser nesta noite. Ele falou que queria esse presente de dia dos pais…[risos]

O dia ainda não acabou. Mas venha no seu tempo. Nosso amor está pronto!

Quem sabe você também tem sonhado com ele como eu sonho com o meu pai. Você vai ver que por mais lindo que sejam os sonhos com nossos pais eles ainda são mais especiais pessoalmente. Você vai amá-lo muito e ele a você (pois já te ama – e também te sonha!). Vem ver, filha!




domingo, 5 de agosto de 2018

18a Carta para minha filha

18a CARTA PARA MINHA FILHA

(Continuando a carta anterior)

Quando nos apaixonamos criamos eixos que sustentam nosso encontro (e reencontro, que precisa ser repetido com a mesma potência para estar vivo e novo). É fato que todo relacionamento duradouro se faz de “recontratos”, pois mudamos sempre, mas o nascimento de uma criança deve ser o que de mais transformador possa acontecer a um casal. Como se de repente a substância de duas pessoas fosse demasiada para seus corpos e inundasse de líquido humano, fértil, perfumado e amoroso um outro “pote” corporal. Você, filha, já nasce banhada pelo nosso amor e emerge dele também. Você é fruto e motivação do nosso encontro, geradora e consequência da nossa união. 

Mas por inspiração nas conversas que temos com Madhuri ( @madhuri_oficial ), a doula, reconhecemos que após o seu nascimento, quando o furacão da transformação tiver passado e deixado suas marcas, precisaremos olhar com profundidade para quem somos, fatalmente seremos outros. Teremos que atravessar a redescoberta da nossa alma para então nos apresentarmos novamente. (Sugestão baseada nos estudos da Madhuri)

“Olha, meu nome é Aline, hoje eu gosto disso, eu não gosto mais daquilo, eu me interesso por isso, para mim é importante aquilo. Para tal coisa eu não ligo mais, porém preciso disso e posso oferecer isso. Para mim relacionamento se tornou isso. Você topa?”

Filha, o seu pai há de fazer o mesmo e me dizer. Poderemos pensar se somos capazes de levar adiante um casamento tão diferente do que aquele ao qual nos dissemos “sim, eu quero me casar com você”, mas sabendo disso parece que será ao menos um pouco mais fácil, estaremos mais abertos a nos compreender e compreender o outro. Pode ser que daremos como resposta: “Vai ser difícil para mim tolerar essa parte! Mas aceito tentar” e também pode ser (sou romântica e otimista, filha!) que nos apaixonemos ainda mais e mais profundamente por aqueles que seremos, após você passar por nós. É assim que sinto. (Continua na próxima carta)

#cartasparaminhafilha

19a Carta para minha filha

19a CARTA PARA MINHA FILHA

Filha, nas horas doces da vida vi muitas vezes escapar, do homem que amo, o seu pai em um sorriso. Saía sem timidez ao olhar um bebê, carregar uma sobrinha, ou te imaginar. Em alguns momentos antes de dormir a se perguntar "já pensou uma menininha dormindo aqui com a gente?"


Desde que ele instalou você no meu ventre esse sorriso tão pouco assíduo foi ficando mais presente e duradouro. Um sol brilhante no rosto dele, um sol todo seu, filha, direcionado para essa lua cheia, crescente, luminosa, na minha barriga. Há meses, quando notamos você se expandir como uma semente que rompe a terra para cumprir seu destino de árvore, ele começou a conversar com você todas as noites antes de dormir. "Está quentinho aí, filha? Deve ser gostoso estar na barriga da mamãe! A gente está te esperando. Vai ser gostoso aqui também. Olha, a saída é por aqui!". Dizia ele apertando levemente meu baixo ventre. Outros dias ele contava algum acontecimento "Filha, hoje fizemos o ultrassom e vimos você!" ou ainda "Hoje a vovó veio aqui em casa e levou umas roupinhas suas para lavar". Também fazia muitas perguntas como se sua voz estivesse disponível para responder e fosse decifrável para nós "Já está dormindo, filha? Tá acordada?" e com as mãos ficava sentindo se você correspondia com algum movimento, como se você estivesse nos ensinando o seu alfabeto próprio que o deixava mais entusiasmado em traduzir "É mesmo? Acordou?" E olhava para mim, como se para confirmar que eu também testemunhava o fenômeno de um pai amar e se comunicar com uma filha que ainda não nasceu. Por vezes meu olhar ficava turvo de lágrimas. Enquanto te dizia em palavras, filha, ele me validava em silêncio, seu pai reconhecia em mim a mãe emanando carne, ossos, sangue, te nutrindo de vida e ele ali, nos nutrindo de amor. O seu pai tem tanto amor dentro de si, que ele se esparge em arte e em ciência, em música e em poesia, em presença e em abraço, em carinho e no sorriso dele. Meu pai, filha, o avô que você não vai conhecer fisicamente quando nascer, dizia que "era um sorriso capaz de iluminar uma sala toda".


Daqui uma semana será domingo de dia dos pais. Fico pensando se você vai querer passar essa data dentro de mim ou no colo do seu pai, se ele estará olhando seus olhos ou o meu umbigo e se estaremos sorrindo de amor ou de ansiedade. Você escolhe, filha!








17a Carta para minha filha

17a CARTA PARA MINHA FILHA

Uma das coisas que tenho aprendido nessa gestação é que, nós humanos, nos distanciamos tanto de nossa essência que precisamos do afeto, na conexão com outros seres, para nos aproximar de novo, não só do outro, mas da gente mesmo. Afinal o outro é apenas uma representação ou projeção do que somos por dentro.

Lembro que meu obstetra, Dr. @brauliozorzellaobstetra quando o questionei sobre a anestesia, me respondeu: “Há uma anestesia natural, que já falei pra você. Lembra qual é?” 
Pensei um pouco se era alguma medicina, fiquei tentando me lembrar, até que me surgiu a resposta: a doula! 
Uma outra mulher (em geral) que estuda o humano, a gestação e o parto e que fica disponível para nos ensinar ou nos lembrar da nossa natureza feminina e potente, sobrevivente e criadora, forte e transcendente...
Quando engravidei eu não tinha claro que ia querer uma doula profissional comigo. Para mim poderia ser alguém da família que se disponibilizasse a essa função, mas conversando com minha irmã @adelitaahmad que viveu 2 partos com doulas diferentes, ela me alertou que como minha irmã não se sentia capaz de oferecer o mesmo que uma doula. Nessa fase em que eu estava fazendo a escolha, primeiro internamente filha, a figura da @madhuri_oficial me veio à mente. Ao menos era uma pessoa conhecida, embora não tão próxima. Pesquisei outras pessoas que me indicaram. Até que somente mais para o final da gestação fui sentindo que minha escolha (ou sua, filha!) era a primeira e mais intuitiva: a primeira que me veio à mente. Então ela propôs alguns encontros comigo e com o Paulo, para nos alinharmos. Ela também é professora de yoga para gestantes e com ela aprendemos posições e exercícios para praticarmos juntos criando um repertório corporal ao qual poderemos nos remeter quando você resolver chegar, filha. Considero também muito preciosas as conversas que ela suscitou para nós como casal, o conteúdo de autoconhecimento e consciência do quanto você irá mudar nossas vidas, do quanto nos seremos outros ao sermos atravessados por você, e do quanto precisaremos restabelecer laços entre duas pessoas novas que nos tornaremos. 
(Continua) #cartasparaminhafilha





16a Carta para minha filha

16a Carta para minha filha

Enquanto publico as cartas que escrevo a você, filhinha, muitos corações nos acompanham. A sua mãe tem mesmo gosto por ser lida e partilhar o que sente. Além de te deixar esses vários símbolos de amor, cada carta também espalha pelo vento do mundo a conexão única que estamos criando mesmo antes de você nascer. Na carta anterior falei da nossa bagagem, que ao nascer já está um pouco cheia, nela trazemos também alguns segredos que aos poucos somos capazes de revelar a nós mesmas. Não são inventados, só mal compreendidos. São origens anteriores a nós. Veja só, filha, eu com esse prazer pela escrita e minha mãe cursou Letras. Eu com meu amor pela educação e minha mãe e pai são pedagogos. Jung, um homem muito admirado por nossa cultura, querida, e que deixou uma linda obra de pesquisa sobre o humano e nosso inconsciente (onde provavelmente esta bagagem se situa), tem uma frase muito boa que diz mais ou menos assim: “Nada influencia mais os filhos do que a vida não vivida de seus pais”. Todos os sonhos que eu não viver pode ser que sobrem como peso na sua bagagem. Preciso viver meus sonhos!

Porém não sei se Jung previu que podemos também ser escolhidos por almas que compartilham nossos sonhos. Acredito que de alguma forma escolhi assim meus pais, os que já amavam o que eu também amava, mesmo antes de mim. Como e por que será que você nos escolheu?🙏🏻💜 #cartasparaminhafilha

📸 @sitah_photoart





 #cartasparaminhafilha
📸 Sitah

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

15a carta para minha filha

15a Carta para minha filha


Como é sábia a natureza, filha!

A mulher tem 9 meses para tornar-se mãe. Um tempo de mergulho em si mesma. Acontece ou acontece. Algumas podem viver isso propositalmente com entrega e consciência. Quando não é possível existe o sono incontrolável que toma as grávidas. Não é só cansaço, é tempo para se assimilar internamente todas as transformações. O sono permite os sonhos, as imagens e histórias inverossímeis que formulam na alma o que precisa ser vivido ou revisto, revisitado. Também é comum que a gestante se torne mais seletiva, escolha melhor com quem irá encontrar, de quem irá se aproximar ou distanciar. Às vezes o distanciamento pode ocorrer mesmo de pessoas muito amadas, mas se alguma convivência não está trazendo amor e acolhimento, sem nem notar, a gestante se afasta, e não faz isso por si mesma, mas pela criança que carrega e que não pode se defender sozinha. É o instinto materno protegendo a cria. Não é incrível? 


Olhando para trás, nesses meses, filha, me percebi algumas vezes em conversas desagradáveis. Lembro que logo minhas mãos tocavam a barriga na tentativa de criar uma barreira para aquele conteúdo não atingir você. Também me notei mais caseira, querendo mais horas de descanso, sono, ou de lazer divertido e gostoso que fizesse bem pra mim e pudesse agradar você também. Acho que fiz essas coisas com pouca consciência e escolha, por isso celebro a minha natureza feminina que me guiou nessas direções. 


O mundo está evoluindo mas continua um tanto despreparado para compreender os processos internos humanos. Carregamos a bagagem do nosso passado e dentro dela a bagagem de todos nossos antepassados com as percepções deles, dores, mágoas, alegrias e belezas de todo o tipo. Essa hereditariedade está ainda mais presente na gestação, na maternidade e na paternidade, porque justamente estamos ampliando para mais uma geração que irá carregar a nossa bagagem. Quando abrimos essa “mala” de conteúdos inconscientes e procuramos compreender (o que implica nos compreender), damos a oportunidade de que o próximo carregue uma bagagem mais leve. Tenho tentado aliviar o tempo todo o peso da sua bagagem, filha.

📸 @sitah_photoart 



14a Carta para minha filha

14a Carta para minha filha

Já me sinto mais ansiosa, filha. Às vezes preocupada. Já estamos juntas há meses e parece que foram passos que você deu na minha direção. Ou na direção da minha vida. Você está prestes a bater na porta do meu mundo. Um outro, além desse que tenho sido pra você. Não temos hora marcada, previsão exata de chegada. Sua avó (@lauriav) diz que é como se você estivesse já com as malas prontas para a viagem, pode acontecer a qualquer momento. E abro o seu armário e vejo suas malas prontas mesmo, com suas primeiras roupinhas, suas mantas quentinhas, tudo separado com tanto amor. Você tem de tudo. Pequeninas coisas. E você me tem. Você tem a mim, você tem a seu pai, suas duas avós, um avô, (outro que pode estar guiando seu espírito com o afeto que inspirou a minha vida), tias, tios, primas... Somos a constelação na qual você vem brilhar. 
Ainda não conheço o brilho dos seus olhos, mas sei do brilho do olhar dessas pessoas para você. Já vi todos eles sorrindo e amando. Algumas dessas mãos já te acariciaram, distantes de ti apenas pela minha pele. Algumas vozes te disseram doçuras e lábios te dedicaram beijos e eu que recebi essas ternuras, filha, mas são todas pra você. Procuro guardá-las como a um tesouro, a herança mais valiosa que eu poderia deixar: o amor!
Ninguém em sã consciência troca amor por fortunas materiais. Pois nós humanos vivemos sem luxo, mas não sobrevivemos sem amor. Para viver precisamos do outro. Você nascerá dependente desse amor, do meu leite, dos meus olhos mirando os seus e eu me sentirei mais dependente de toda essa rede de pessoas para me amparar e me deixar inteira para tudo que desejo te dar. Para que não te falte meu amor espalhado em tudo que quero e preciso oferecer a você. Só da centelha desse amor nascerá a sua jornada, filha. 
💜
#cartasparaminhafilha
📸 Sitah Ji




quinta-feira, 2 de agosto de 2018

13a CARTA PARA MINHA FILHA

13a Carta para minha filha

São tantas lindas fotos com você oculta na minha barriga. Esta, de um mês atrás, com 34 semanas (acho!), e já me sentindo explodindo. Mas a gente vai e se expande mais. Viver já é ultrapassar limites, “maternar” é mastigá-los, bebê-los, até se constituírem naquilo que somos. 
Eu não tinha mais para onde crescer, mas você foi me impondo seu espaço, e toda mãe cresce por dentro o tamanho que se expande por fora. 
Estou aprendendo a me amar. Amando mais meu corpo, que carrega você, filha. Amando a barriga que sempre evitei mostrar. Agora, com você dentro, é a parte mais linda de mim. Também é a que seu pai mais se orgulha, sabia?
Ele diz para os amigos, quando estamos juntos: “você viu a barriga da Aline?”, como se estivesse mostrando a filha.  Ele sorri e ri enquanto conversa em voz doce com você todos os dias antes de dormir. Você sempre se mexia ao ouví-lo, mas agora tem ficado mais quietinha neste momento. 
Esses dias, em uma meditação, vi você com aproximadamente um ano, saindo de uma luz e caminhando na minha direção. Tão linda! Usava um vestido azul escuro, parecia jeans, andava como se tivesse aprendido há pouco tempo e vinha na minha direção. A medida que você caminhava eu a amava e admirava cada vez mais. Vi alguns traços da sua beleza... Os cabelos eram negros e lisos (será que serão assim?) Será que vi você ou era apenas uma projeção?
Em breve nos veremos do lado de cá e em algum tempo terei certeza se vi sua alma caminhar ou apenas se meu coração a imaginou. 💜
#cartasparaminhafilha