quinta-feira, 29 de março de 2018

Primeiro ultrassom

Assim que constatamos a gravidez, o Paulo ligou para a prima obstetra que disse a ele o conselho que dá a todas as suas pacientes:


“Com o teste de farmácia você conta ao marido”

(No meu caso praticamente ele que tinha me contado...rs)

E ela continuou:

“Após o primeiro ultrassom conte para seus pais e irmãos. E após o ultrassom morfológico, dos 3 meses de gravidez, vocês contam para todos”


Procuramos seguir o conselho à risca, bem cientes de que a gravidez só fica mais segura após os primeiros 3 meses. 





Marcamos o ultrassom para os próximos dias. No dia do ultrassom eu também quis aproveitar para fazer o exame de sangue. O Paulo queria que eu fosse só no final do dia, pois achou que não daria tempo de chegar no horário marcado do ultrassom, olhei no relógio e achei que dava. Eu queria que ele fosse comigo e sabia que no final da tarde não estaríamos juntos, então indignada por ele preferir que eu fosse só no final do dia, sozinha, eu saí meio desaforada: “se você não quer ir agora comigo eu vou, vou sozinha então, você me pega lá e vamos juntos para o ultrassom”. Saí com raiva de casa. Com vontade de ir sozinha para o ultrassom também, só pra me “vingar” e não deixar ele ver o primeiro momento do nosso bebê. Mas eu sabia que ia me arrepender se deixasse a minha raiva tomar conta... Quando ele passou pra me pegar já entrei no carro chorando, me sentindo a maior vítima do mundo por ele não ter movido uma palha para me acompanhar no exame de sangue também (olha como as emoções já foram ficando a flor da pele!)


Fui falando que já desmaiei algumas vezes tirando o sangue, que sempre recomendam que eu leve acompanhantes (mas já faz alguns bons anos que vou sozinha e nunca mais desmaiei ou precisei de ajuda), falei que esperava que ele fosse mais sensível e cuidadoso comigo, ele foi ouvindo, me pedindo desculpas e rindo. O Paulo ri quando eu choro e percebe que é por bobagem. Ele não ri da minha cara, é o riso que damos olhando a inocência das crianças, é um riso diante de uma beleza. E quando ele ri assim de mim eu consigo reconhecer que estou exagerando um pouco, ou me aproveitando da situação para me vitimizar. E também me sinto amada neste riso que me contempla e aceita. 

Já estava tudo bem entre nós,  mas quando cheguei no lugar onde faríamos o exame meus olhos estavam inchados de choro. Pedi um tempinho para o Paulo, para descermos em seguida. Eu estava com vergonha da minha cara e nem tinha pensado o quanto chorar deve ser um acontecimento natural naquele recinto. Em geral o choro de emoção, imagino e espero. 


Entramos na sala de exame. Sentei e fiquei bem de frente para uma tela bem grande. O Paulo ficou de frente pra mim olhando a tela do computador do médico, que estava ao meu lado. Acho que ele nem percebeu essa tela maior. Foi tão mágico pois o rosto dele foi o que vi de mais nítido na hora que ouvimos o coração bater. Não tinha muito o que ver na tela, mas ele deu um passo pra frente como se tivesse sido empurrado, ou levado um susto, então abriu a boca, arregalou os olhos, com as sobrancelhas bem levantadas, e quis confirmar com o médico: “É o coração?”

O médico respondeu que sim. Mas o Paulo também é médico. Ele sabia que era o coração. É que a nossa alma precisa de uma confirmação para acreditar nos momentos de beleza e alegria. É como se disséssemos “me belisca para que eu tenha certeza que não é um sonho”. Mas não era um sonho, a realidade é que é inacreditável*

Eu achei que os olhos dele estavam lacrimejando, os meus estavam (e estão de novo ao lembrar). Alguns dos mais memoráveis momentos da minha vida eu passei vendo o sorriso dele, as emoções dele, e mais uma vez Deus estava me presenteando com a cena do seu sorriso, da sua alegria, bem diante dos meus olhos, e o motivo, desta vez, era a constatação de que dentro de mim tinha um outro coração batendo, uma outra pessoa feita de pedaços nossos misturados. ❤️❤️❤️


(*frase do livro: Uma aprendizagem, de Clarice Lispector)


(Foto tirada perto do dia que fizemos o ultrassom)

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